Da torneira do nordestino atendido pela
transposição do rio São Francisco vai pingar a água mais cara do país. O
Conselho Gestor do Projeto de Integração do São Francisco avalia cobrar
dos Estados atendidos pela obra R$ 0,13 por mil litros de água. O
dinheiro será recolhido pela Agnes, estatal em gestação na Casa Civil. A
empresa vai gerenciar as operações da transposição do rio e a
distribuição da água para as previstas 12 milhões de pessoas
beneficiadas.
O preço médio cobrado em outras bacias hidrográficas pelo uso da água
é de R$ 0,01 a R$ 0,02 por mil litros. A Sabesp, por exemplo, paga R$
0,015 ao comitê gestor da bacia do rio Piracicaba, fonte de metade da
água consumida na cidade de São Paulo. O valor mais elevado, afirma o
governo, se deve à complexidade do projeto de transposição e ainda
porque a Agnes será a responsável pela captação e pelo bombeamento da
água.
No entanto, os quatro Estados envolvidos (Pernambuco, Paraíba, Rio
Grande do Norte e Ceará) terão de investir em obras internas para dar
capilaridade à rede de água e ainda precisarão pagar uma taxa fixa à
Agnes, provavelmente mensal.
Em construção, os canais para a transposição do rio São Francisco têm
25 metros de largura, 5 metros de profundidade e 622 quilômetros de
extensão, somando os dois eixos.
O porte das obras e os obstáculos naturais, como a Serra da
Borborema, que vai de Alagoas ao Rio Grande do Norte, explicaria o alto
custo de transportar a água no semiárido nordestino. Para isso, serão
necessários potentes mecanismos de bombeamento.
Subsídio é incógnita
O responsável pelo empreendimento é o Ministério da Integração
Nacional, gerido pelo ministro baiano João Santana. O governo não diz se
haverá mecanismo para amortizar o custo do consumidor final nos quatros
Estados.
Em teoria, as obras do São Francisco têm um foco prioritário,
que são os pequenos agricultores das terras secas do sertão e do agreste
nordestinos. O ministério afirma que o assunto está em fase de análise e
de debates com os Estados receptores.
Para que o projeto seja viável, é possível que os Estados promovam
subsídios cruzados, aumentando as tarifas de grandes centros urbanos que
não receberão as águas da transposição do Velho Chico, como Recife. A
Agnes terá de apresentar um relatório de custos, explicando os motivos
para o elevado preço da água.
Essa tarifa deverá cobrir os gastos do sistema de transposição em
funcionamento, nem mais nem menos. “Temos de avaliar a planilha de
custos da agência para saber se o preço está certo. A tarifa deve cobrir
os custos de manutenção e operação do sistema”, diz Patrick Thomás,
gerente de cobrança pelo uso da água da Ana (Agência Nacional de Águas).
Um dos maiores críticos do projeto, o pesquisador João Suassuna, da
Fundação Joaquim Nabuco, acha difícil que o agricultor das áreas
atendidas pela transposição consiga pagar essa conta. “Os colonos do
Vale do São Francisco hoje já estão com dificuldades para pagar por uma
água a R$ 0,02.
Imagine com esse preço”, afirma o Suassuna. Mas o pesquisador vê
outro problema. O porte das obras e o volume de água deixam patente que o
propósito da transposição não é matar a sede e a fome de quem vive na
seca.
A mira, afirma, está no agronegócio para exportação, a criação de
camarão e o abastecimento de indústrias.
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