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Vista panorâmica da cidade de XiqueXique-BA |
Famoso cancioneiro baiano nascido no litoral da Bahia de
Todos os Santos e dos milagres, Dorival Caymmi veio a indagar aos seus ouvintes e
correligionários, em tom poético e em especial a uma senhora afrodescendente,
se eles já foram à Bahia.
Na remota possibilidade de alguém não conhecer a Bahia, Caymmi até lançou a receita de culinária, convidando turistas americanos, afegãos, argentinos, jordanianos, piauienses e sergipanos, com imposição: “Então vá, porque lá tem munguzá, carurú e vatapá”.
Quem verificar a letra desta composição do saudoso Dorival, entenderá que a Bahia a que ele se refere, é tão somente a Cidade do Salvador, a Soterópolis que pertence tanto aos santos católicos quanto aos orixás, jamais ao Sertão.
A população baiana que vive longe, afastada do litoral, aquele povo do interior, notadamente do semiárido, nós xiquexiquenses, quase não comungamos com as identidades, com o estilo de vida do espaço metropolitano, da faixa litorânea, da capital e do recôncavo.
A culinária, os festejos religiosos, as manifestações de cultura, o sotaque ou a maneira de pronunciar as palavras, são diferentes. O Sertão, pensado por Euclides da Cunha, Guimarães Rosa e Patativa do Assaré, transmite e revela um contexto filosófico, uma maneira de ser, um longe bem perto como assim nos oferece a légua de beiço, ao abstrair simbolicamente a quilometragem que é uma invenção dos neurastênicos do litoral com diria Euclides.
Houve um tempo em que se ia à Bahia quando se viajava para a capital. Salvador era considerada toda a Bahia. Até mesmo Jorge Amado distingue Salvador e seu recôncavo como o protótipo cultural da amabilidade, da sensualidade, da valentia e da malemolência. Para tanto contou com o adjutório de todo aparato midiático, artístico, literário e acadêmico quando romantizou a Soterópolis, seus becos, mercados, rendez-vous, lupanares e assemelhados, enquanto o sertão foi associado à pobreza, ao conflito, à ruralidade, embora sob este ponto de vista o escritor Wilson Lins, autor de "Remanso da Valentia" e dos "Cabras do Coronel", nascido nas barrancas do Velho Chico, em Pilão Arcado, pensou de forma antagônica e mítica ao historiar a faina, a intrepidez, a bravura do homem do sertão.
Num contraponto interessante a respeito do sertão e do litoral da Bahia, um dia, ainda estudante, questionei um eminente professor de direito e de ciência política, quando ele, açodadamente, dizia em alto e bom som: “A teratologia política talvez tenha origem em XiqueXique.” referindo-se aos "Barulhos", às disputas políticas acirradas do começo do Século XX, ocorridos na aprazível cidade barranqueira.
Pela constatação histórica, presenteei o professor com um exemplar de Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, edição comentada.
Por esses pormenores, fui denominado Riobaldo Tatarana pelo estimado professor.
Aliás, sou velho companheiro desse personagem central de Grande Sertão: Veredas, livro que revelou ao Brasil letrado o que o sertanejo tem a dizer e talvez eu não tenha dito.
Se o Brasil vai do Oiapoque ao Chuí, a Bahia vai desde o Rio São Francisco no município de Curaçá, à Barra do Riacho Doce no município de Mucuri, no sentido Norte-Sul. Já Salvador, para se saber os seus limites, só pesquisando...ou viajando de metrô.
Nilson Machado de Azevedo
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