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Quem diria, nasci na Bahia (II)

5/21/2015


Vista panorâmica da cidade de XiqueXique-BA


Famoso cancioneiro baiano nascido no litoral da Bahia de Todos os Santos e dos milagres, Dorival Caymmi veio a indagar aos seus ouvintes e correligionários, em tom poético e em especial a uma senhora afrodescendente, se eles já foram à Bahia.

Na remota possibilidade de alguém não conhecer a Bahia, Caymmi até  lançou a receita de culinária, convidando turistas americanos, afegãos, argentinos, jordanianos,  piauienses e sergipanos, com imposição: “Então vá, porque lá tem munguzá, carurú e vatapá”.

Quem verificar a letra desta composição do saudoso Dorival, entenderá que a Bahia a que ele se refere, é tão somente a Cidade do Salvador, a Soterópolis que pertence tanto aos santos católicos quanto aos orixás,  jamais ao Sertão.

A população baiana que vive longe, afastada do litoral, aquele povo do interior, notadamente do semiárido, nós xiquexiquenses, quase não comungamos com as identidades, com o estilo de vida do espaço metropolitano, da faixa litorânea, da capital e do recôncavo.

A culinária, os festejos religiosos, as manifestações de cultura, o sotaque ou a maneira de pronunciar as palavras, são diferentes. O Sertão, pensado por Euclides da Cunha, Guimarães Rosa e Patativa do Assaré, transmite e revela um contexto filosófico, uma maneira de ser, um longe bem perto como assim nos oferece a légua de beiço, ao abstrair simbolicamente a quilometragem que é  uma invenção dos neurastênicos do litoral com diria Euclides.

Houve um  tempo em que se ia à Bahia quando se viajava para a capital.  Salvador era  considerada toda a Bahia.   Até mesmo  Jorge Amado distingue  Salvador e seu recôncavo como o protótipo cultural da amabilidade, da sensualidade,  da valentia e da malemolência. Para tanto contou com o adjutório de  todo aparato midiático, artístico, literário e acadêmico  quando romantizou a Soterópolis, seus becos, mercados, rendez-vous,  lupanares e assemelhados,  enquanto  o sertão foi associado à pobreza, ao conflito, à ruralidade,  embora sob este ponto de vista  o escritor Wilson Lins, autor de "Remanso da Valentia" e dos "Cabras do Coronel", nascido nas barrancas do Velho Chico, em Pilão Arcado,  pensou  de forma antagônica e mítica ao historiar a faina, a intrepidez,  a bravura  do homem do sertão.

Num contraponto interessante a respeito do sertão e do litoral da Bahia, um dia, ainda estudante, questionei um eminente professor de direito e de  ciência política, quando ele, açodadamente,  dizia em alto e bom som: “A teratologia política  talvez tenha origem em XiqueXique.” referindo-se aos "Barulhos", às disputas políticas acirradas do começo do Século XX,  ocorridos na aprazível cidade barranqueira.

Pela constatação histórica,   presenteei o professor com um exemplar de Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, edição comentada.

Por esses pormenores, fui  denominado Riobaldo Tatarana  pelo estimado professor.

Aliás, sou velho companheiro desse personagem central de Grande Sertão: Veredas, livro  que revelou ao Brasil letrado o que o sertanejo tem a dizer e  talvez eu não  tenha dito.

Se o Brasil vai do Oiapoque ao Chuí, a Bahia vai desde o Rio São Francisco no município de Curaçá, à Barra do Riacho Doce no município de  Mucuri, no sentido Norte-Sul. Já Salvador, para se saber os seus limites, só pesquisando...ou viajando de metrô.

Nilson Machado de Azevedo



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