É preciso bater um recorde mundial de
hipocrisia para simular surpresa diante da denúncia de que o presidente
interino Michel Temer recebeu 1,5 milhão de reais do esquema apurado na Lava
Jato para entregar à campanha de Gabriel Chalita em 2012.
Nem o desmentido formal merece mais
credibilidade do que qualquer outra resposta padrão nesses tempos, redigida com
a linguagem calculista dos advogados. Faz parte do show.
Da mesma forma que, após um rápido
intervalo, quando as cortinas se reabrem.
Para completar, Henrique Eduardo
Alves, que virou a casaca de ministro de Dilma para permanecer no mesmo cargo
com Temer, pede demissão para evitar novas crises de um governo que mal foi
empossado.
Sabemos que o financiamento da
política brasileira sempre se fez dessa maneira, numa troca de interesses entre
partidos em busca de recursos e empresários atrás de favores do Estado.
Levantar recursos para candidatos, como descreve a denuncia contra o vice, na
página 41 do depoimento ao Ministério Publico, faz parte das atribuições
essenciais da maioria dos lideres políticos do país.
Temer é personagem de
destaque nessa categoria, não pela liderança popular, que nunca teve, mas pela
atuação nos bastidores.
Podemos lembrar que a presença de
Temer na lista dos denunciados não é prova de culpa. Está bem. Mas, se o
gravador de Sergio Machado falou a verdade sobre Renan Calheiros, sobre Romero
Jucá, sobre José Sarney, por que estaria mentindo sobre Michel Temer?
O tratamento hipócrita que será dado
a essa denúncia levanta outro temor, igualmente conhecido -- a seletividade das
acusações de corrupção.
Nestor Cerveró, o diretor da
Petrobras que antecedeu Machado no palco dos grandes delatores, afirmou que
nenhuma propina superou um montante equivalente a US$ 100 milhões, numa
negociação da Petrobrás na Argentina. Nenhuma outra das dezenas de tratativas
grandes, pequenas ou médias, chegou a este montante. Alguém foi investigado?
Preso? Delatou? Nada.
Não chega a ser novidade lembrar um
detalhe: estas negociações milionárias ocorreram em 2002, quando Fernando
Henrique Cardoso ocupava a presidência. Já na primeira CPI sobre a Lava Jato,
em 2014, este caso rondava as investigações. Nunca foi adiante, embora seja um
montante considerável para um acerto só.
Basta ler o Diário da Presidência
escrito por Fernando Henrique Cardoso para encontrar, na página 793 do volume
1, a descrição detalhada de um esquema de desvios e abusos na Petrobras. O livro
informava nomes de quem comandava o que, em nome de quem – e a confissão de que
nada se fez. FHC estava no início do governo. A negociata denunciada por
Cerveró ocorreu no final.
Em 2016, o fato de uma denúncia de
igual teor atingir o vice de uma presidente que enfrenta um golpe de Estado do
qual foi um dos arquitetos e maior beneficiário direto apenas demonstra
que a justiça do espetáculo se esgotou e não pode sobreviver, a não ser
amparada em atos de exceção.
Não é a primeira vez que isso ocorre
com o vice, a rigor. Temer, hoje, já é um beneficiário da condição de
quem recebe um tratamento desigual para uma denúncia igual. Estou falando das
acusações de pedaladas fiscais. Se serviram para afastar Dilma da presidência,
deveriam ter impedido que Michel Temer assumisse o cargo.
O ministro Marco Aurélio Mello já
determinou que o Congresso forme uma Comissão para investigar as
responsabilidades do vice Temer em decretos que assinou, no valor de alguns
bilhões de reais. Até agora, nem a Comissão se formou.
O país não precisa de campeões de
moralidade nem de espertalhões que utilizam a máquina pública para proteger
amigos e perseguir inimigos. Este é o caminho de uma ditadura policial, que se
constrói pela manipulação da Justiça e polícia, mobilizadas para atuar em nome
de interesses políticos.
O país precisa de uma Justiça que
faça seu trabalho, num ambiente de isenção e serenidade, sem questionar a
separação entre os Poderes, compreendendo que seu papel, acima de tudo,
consiste em proteger os direitos democráticos do cidadão perante o Estado.
“A hora do espetáculo está acabando.
Deve começar a política”. Se é
indispensável tentar vislumbrar algum futuro para nosso sistema político, nem
que seja como homenagem a filhos e netos, cabe reconhecer que a origem da crise
encontra-se na incapacidade da elite brasileira em admitir o resultado das
urnas e que o primeiro passo envolve o acerto de contas com o passado recente
-- o retorno aos direitos e garantias previstos na Constituição de 1988, a mais
progressista de nossa história.
É de se defender e recuperar um regime de liberdades construído com sacrifícios por uma população que se emancipava de uma ditadura e nem por um minuto deseja retornar a um passado de trevas, impotência e medo. É preciso separar o que é crime e corrupção daquilo que não passa de notória perseguição política e compreender que a democracia só será recuperada e restaurada por homens e mulheres que a população reconhece como seus líderes e dirigentes. Mais do que nunca, fora Temer. Não é um grito de rua, muitas vezes um cumprimento que substitui bom dia ou até logo.
O retorno de Dilma nunca foi tão necessário. Como expressão do elo direto com a soberania popular, a saída da crise pode levar a muitas medidas posteriores, mas necessariamente passa por ela.
Alguma dúvida?
É de se defender e recuperar um regime de liberdades construído com sacrifícios por uma população que se emancipava de uma ditadura e nem por um minuto deseja retornar a um passado de trevas, impotência e medo. É preciso separar o que é crime e corrupção daquilo que não passa de notória perseguição política e compreender que a democracia só será recuperada e restaurada por homens e mulheres que a população reconhece como seus líderes e dirigentes. Mais do que nunca, fora Temer. Não é um grito de rua, muitas vezes um cumprimento que substitui bom dia ou até logo.
O retorno de Dilma nunca foi tão necessário. Como expressão do elo direto com a soberania popular, a saída da crise pode levar a muitas medidas posteriores, mas necessariamente passa por ela.
Alguma dúvida?
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