Presidente afastada enfrenta nesta segunda-feira (29) o seu segundo
interrogatório em defesa da democracia brasileira; corte de exceção da vez é o
Senado da República, cujos integrantes seguem fielmente o roteiro já
determinado do golpe, em um impeachment sem crime; é impossível não associar a
inquirição atual àquela de novembro de 1970, no Rio de Janeiro, onde a jovem
Dilma, com 22 anos, após 22 dias de tortura nos cárceres da ditadura, era
interpelada por uma junta de covardes uniformizados, com as mãos sobre os
rostos para esconder suas identidade
A presidente afastada Dilma Rousseff (PT) encara nesta segunda-feira
(29) o seu segundo interrogatório em defesa da democracia brasileira. O
tribunal da vez é o Senado da República, que deveria ser o bastião de liberdade,
mas que sombriamente tornou-se nos últimos dias uma praça de exceção, dentro de
um roteiro já determinado do golpe contra a presidente e ao menos 54,5 milhões
de brasileiros que a nela depositaram seus votos nas últimas eleições.
É impossível não associar o interrogatório desta segunda-feira àquele de
novembro de 1970, no Rio de Janeiro, onde a jovem Dilma, com 22 anos, após 22
dias de tortura incessante nos cárceres da ditadura, era interrogada por uma
junta de covardes uniformizados, com as mãos sobre os rostos na tentativa de
esconder suas vergonhas. Aquele interrogatório, como este, será inscrito nos
livros como dois dos episódios mais repugnantes da história brasileira.
O que diferencia os dois tribunais é a evolução do cinismo daqueles que,
hoje no Senado, assemelham-se aos personagens de 1964. Saíram das sombras e
hoje mostram as faces sem rubor, seguidos de uma horda de traidores que dançam
conforme a música do golpe tocada no Palácio do Jaburu, quartel general do
arbítrio contemporâneo.
Dilma hoje representa a figura da decência em um mar de iniquidade.
Reflete o Brasil que é visto com alegria e potencial de transformações sociais
no mundo. Sua deposição, ao contrário, constrange os golpistas e macula o nação
aos olhos internacionais. O golpe é descrito com precisão nos jornais francês
L’Humanité como o golpe do colarinho branco e mesmo no norte-americano The New
York Times como um ataque de ratos contra uma Dilma acuada.
Dilma, ao enfrentar seus algozes pela segunda vez, novamente de peito
aberto, refaz a jornada da heroína em um roteiro capaz de esculpir um mito de
resistência democrática. Assim será ela descrita na história.
Há o risco, porém, de que a sessão do Senado se transforme novamente em
um circo, uma tentativa de turvar a lente da história. Reunidos, os golpistas
falam em recepção respeitosa e em liturgia; tentam atribuir a baderna que se
tornou o Senado aos defensores da presidente afastada. Não admitirão sequer a
menção da palavra golpe, por ninguém. Estão dando a senha de que a sessão
será propositalmente tumultuada.
O
mas histriônico dentre os golpistas, Ronaldo Caiado (DEM-GO), já ensaia sua ode
de provocação. Revelou, em tom de basófia, que pretende cantar “Amanhã vai ser
outro dia...”, de Chico Buarque, um hino contra a ditadura. Chico estará na
galeria, com Lula, entre os convidados da presidente.
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