Num timbre exasperado a matraca soa demoradamente e a lamentação segue a passos lentos pelas estações da Via Sacra a entoar benditos e padre-nossos. Os penitentes flagelam-se com as lâminas afiadas da “disciplina”, num suplício multifacetado de arrependimentos buscando redimir os próprios pecados e os alheios.
Acredita-se que as almas santas, aquelas que estão a levitar no limbo do purgatório, acompanham os fiéis penitentes durante a lamentação e que se alimentam das orações, em forma de benditos, na esperança de atenuar os seus sofrimentos, numa espécie de progressão da penitência fechada para o regime aberto, celestial.
Os devotos são amparados e recompensados por essas alimentadas almas, habitantes efêmeros do purgatório, lugar de penumbra e de penúria, onde as penas deixam de ser perpétuas.
Os rituais da lamentação praticados pelos penitentes de Xiquexique são dogmas que não podem ser por eles abandonados. Hão de cumprir a liturgia durante sete anos, lapso de tempo em que as almas rogam orações aos vivos, com maior intensidade. No período mínimo de sete anos, esses fervorosos pagadores de promessas devem flagelar-se na Semana Santa.
Mas se um deles abandonar a autoflagelação, as almas santas benditas incumbirão, por si só, de aplicar-lhe a disciplina na região lombar, pois o cumprimento do voto penitencial é compulsório a partir da quarta-feira até a sexta-feira da quaresma.
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