Só um país à beira da irracionalidade completa pode encarar com
naturalidade que um ex-presidente possa ser criminalizado por hastear a
bandeira dos interesses nacionais fora do País; Luiz Inácio Lula da Silva, que
preferiu defender empresas e empregos brasileiros após deixar o poder, está
sendo acusado por um procurador federal de praticar "tráfico de influência
internacional"; ou seja: na lógica arbitrária do MP, Lula cometeu o
gravíssimo delito de defender que empresas brasileiras vencessem concorrências
internacionais em países como Cuba, onde a Odebrecht fez o Porto de Mariel, e
República Dominicana; ação contra Lula ganha páginas de jornais como o
Financial Times, pouco tempo depois de a Foreign Affairs, bíblia da geopolítica
internacional, ter exaltado o avanço do Brasil no mundo na era Lula; este
legado, no entanto, pode ser destruído pelo ódio político, pelo arbítrio e por
interesses internacionais que movimentam a desestabilização do País
No primeiro dia de janeiro de 2011, quando transmitiu a faixa
presidencial à sucessora Dilma Rousseff, o ex-presidente Lula poderia ter
tomado uma decisão parecida com a de vários brasileiros que julgam já ter
cumprido sua missão na Terra: pendurar as chuteiras, aposentar-se e curtir a
vida.
Naquele momento, Lula era chamado por publicações internacionais, como a
revista alemã Der Spiegel, de o "o político mais popular na face da
Terra". O economista Jim O'Neill, que criou a expressão BRICs, o qualificou
como o mais importante líder dos últimos 50 anos no mundo, por ter sido capaz
de comandar um gigantesco processo de inclusão social, dentro de uma complexa
democracia.
Lula, no entanto, decidiu continuar
trabalhando. Criou seu instituto, assim como fizera seu antecessor Fernando
Henrique Cardoso, e passou a rodar o mundo como um embaixador informal do
Brasil, de suas empresas e de seus empregos. Os focos prioritários foram a
África e a América Latina, regiões nas quais, por afinidades históricas e
culturais, o Brasil poderia ampliar sua influência, abrindo oportunidades para
empresas nacionais e, ao mesmo tempo, reforçando a presença do País no jogo
internacional. Deu certo. Tanto que, em sua mais recente edição, a revista
norte-americana Foreign Affairs, tida como a bíblia da geopolítica global,
destacou o avanço do Brasil como ator global nessas regiões.
Fosse o Brasil um país maduro e cioso de seu papel no mundo, Lula seria
tratado como um dos seus grandes ativos. Um líder capaz de inspirar, angariar
simpatias e conquistar apoios para os legítimos interesses comerciais das
empresas nacionais e, também, para as aspirações diplomáticas do País. No
entanto, o ódio político, a disputa pelo poder e interesses internacionais
daqueles que preferem ver o Brasil numa posição subalterna o elegeram como o
alvo a ser abatido.
Foi assim que Lula foi transformado pela revista Época, dos irmãos
Marinho, no "operador", no "lobista" de grandes
empreiteiras. A partir de uma reportagem publicada também no jornal O Globo,
sobre uma viagem de Lula à América Central, teve início o processo que
culminou, nesta quinta-feira, com a abertura de um inquérito criminal contra o
ex-presidente Lula. A acusação: tráfico de influência internacional. Ou seja:
Lula é acusado de usar sua influência em outros países em favor de empresas
brasileiras.
Na lógica do setor do Ministério Público que patrocinou a ação,
melhor seria, decerto, que as concorrências para grandes obras na África e na
América Latina fossem vencidas por empresas chinesas, norte-americanas ou
espanholas, que também disputam esses mercados com empresas nacionais. Também
segundo o MP, haveria tráfico de influência porque Lula abriria portas no
BNDES, como se isso fosse necessário – programas de financiamento à exportação
de serviços existem há décadas e beneficiam todas as empresas brasileiras que
conquistam obras internacionais.
O inquérito contra Lula, no entanto, já está nas páginas de publicações
internacionais, como o Financial Times e o The Wall Street Journal. Denúncias
contra empreiteiras brasileiras também vêm sendo usadas por concorrentes
internacionais para inviabilizar a presença das construtoras nacionais em
vários mercados.
O grupo Globo, que tem liderado a caçada a Lula, já defendeu,
em seus editoriais, que empreiteiras nacionais sejam substituídas por empresas
de fora até mesmo no mercado interno. Afinal, de acordo com a lógica dos
Marinho, Lula é o criminoso a ser abatido, nem que o custo seja a destruição de
algumas das maiores empresas brasileiras.
Diante de tamanha irracionalidade, o melhor remédio seria fazer do
ex-presidente ministro das Relações Exteriores. Só assim, protegido da
insanidade política, ele poderia continuar trabalhando em defesa de interesses
nacionais, como fez nos anos em que esteve fora do poder.
Associated Press
Leonardo Attuch
Leonardo Attuch
0 comentários:
Postar um comentário
Os comentários serão de responsabilidade dos autores. podendo responder peço conteúdo postado!