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Waldeck Ornelas autor deste artigo |
Em épocas de grande seca, e só nesses momentos, recorrentemente volta a
ser lembrado o grave flagelo humano, ambiental, econômico e social que resulta
da contínua degradação do rio São Francisco – no passado o importante “rio da
unidade nacional”, hoje inteiramente órfão.
De competência federal, onde não é prioridade, o rio também não recebe,
da Bahia e dos baianos, a atenção devida, embora seja a maior bacia
hidrográfica em seu território e percorra vasta área do seu sofrido semiárido.
Ressalve-se o período da Constituição de 46, em que a bacia hidrográfica
teve recursos vinculados, uma iniciativa do deputado Manoel Novais, tendo dado
origem à Comissão do Vale do São Francisco, que muito realizou no contexto e
nas condições da época.
A fase subsequente, da Suvale/Codevasf, demonstrou a importância e a
viabilidade da agricultura irrigada, enquanto a Chesf e a Cemig aproveitam o
seu potencial hidrelétrico. Basta enumerar essas agências governamentais para
ressaltar a importância estratégica e a relevância dessa bacia hidrográfica
para o Nordeste e o país.
Esse reconhecimento, contudo, não existe, embora, diante da necessidade,
as suas águas sejam sempre lembradas até mesmo como solução milagrosa (vide a
famigerada transposição...) para os problemas do semiárido nordestino e suas
secas inclementes. Mas não se cuida de preservá-las.
Todos querem tirar proveito de seu potencial, várias agências públicas
têm interferência na sua gestão, mas não há uma governança capaz de assegurar a
sua sobrevivência. No presente, já se trata de um caso de revitalização.
Sempre afirmei que a revitalização no mínimo precedia a transposição,
cuja viabilidade ainda está por ser provada. O bom senso contudo não
prevaleceu. Destaque-se aqui a heroica resistência de D. Cappio, bispo da Barra,
pela recuperação do rio.
Revitalização que, de resto, não pode ser confundida com o simples
esgotamento sanitário das cidades ao longo do seu curso. Faz parte sem dúvida,
mas isto é função da política setorial de saneamento básico. Face à degradação,
são bem mais graves o desaparecimento de suas matas ciliares, o assoreamento de
seu leito, a negligência com os seus recursos hídricos.
Uma das formas de valorizar é usar. Nesse sentido a hidrovia constitui
um bem que precisa ser recuperado. Para seu funcionamento é preciso que o rio
tenha vigor e saúde. A degradação do rio levou também ao fim da navegação.
Mesmo travessias locais são prejudicadas. E o benefício econômico e social que
a hidrovia propiciou no passado desapareceu de vasta e carente região.
Nesse sentido, o trecho Ibotirama-Juazeiro constitui um segmento
estratégico, o primeiro que deveria ser restabelecido, viável mesmo nas
condições atuais do rio. Hoje em dia, apenas o transporte de algodão é feito,
ainda assim teimosamente. E são mínimos os investimentos necessários, com
grandes benefícios para o Oeste baiano e o Polo Juazeiro/Petrolina.
Dediquei boa parte do meu mandato no Senado à defesa do rio: logo
no primeiro ano consegui criar uma comissão especial para discutir o
desenvolvimento do Vale; em 2001 voltei à carga, com o tema da revitalização.
Já na Constituinte de 88 tentara manter a vinculação de recursos para a bacia
hidrográfica, mas não havia clima para a vitória. Depois dos meus mandatos,
cuidei ainda dessa questão, por meio do SOS Velho Chico.
Fato é que a imensa maioria dos baianos não conhece o Rio São Francisco.
Uma boa parte sabe da sua importância na geração de energia; outros tantos têm
noticia dos prodígios da agricultura irrigada às suas margens; certamente
muitos conhecem a sua história.
Waldeck Ornélas, autor deste texto, é especialista em planejamento
urbano-regional e ex-secretário do Planejamento, Ciência e Tecnologia da Bahia.
CORREIO DA BAHIA
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