Um Juiz de Direito processou
o porteiro do condomínio onde morava por ter sido chamado pelo trabalhador de
"você" e de "cara" e que ouviu a expressão "fala
sério" após ter feito uma reclamação. Segundo o processo, o apartamento do
magistrado foi alagado, ou inundado, por erro do condomínio, mas o funcionário
não o tratou com respeito ao falar sobre o caso.
Além do pedido que exigiu o tratamento de
"senhor" e "doutor", o
magistrado pleiteou que o condomínio fosse condenado a pagar indenização por
danos morais de 100 salários mínimos pela inundação no apartamento.
No
início do processo obteve uma liminar (decisão provisória) que obrigava os
empregados do condomínio a chamá-lo de "doutor" e "senhor".
Entretanto, um outro juiz, de 1ª instância, negou o pedido. Ele
entendeu que, apesar de compreender o "inconformismo" do colega, o
pleito não tinha sentido porque o termo "doutor" não é pronome de
tratamento, mas título acadêmico de quem faz doutorado.
Além disso, sobre o uso de "senhor", o julgador
entendeu que não "existe regra legal que imponha obrigação aos empregados
do condomínio" de utilizar o termo.
Diz um trecho da sentença: "O empregado que se refere ao
autor por 'você' pode estar sendo cortês, posto que 'você' não é pronome
depreciativo. [...] Na relação social não há ritual litúrgico a ser obedecido.
Por isso, se diz que a alternância de 'você' e 'senhor' traduz-se numa questão
sociolinguística, de difícil equação num país como o Brasil. Ao Judiciário não
compete decidir sobre a relação de educação, etiqueta, cortesia ou coisas do
gênero", escreveu o juiz que analisou o caso na primeira instância.
Dessa decisão, houve recurso de apelação para o Tribunal de
Justiça que rejeitou o pedido. Foi apresentado, então, recurso extraordinário,
com a remessa dos autos ao Supremo Tribunal Federal porque, conforme o acatado
requerimento da defesa do recorrente, a questão é constitucional e se refere ao
princípio da dignidade da pessoa humana e ao princípio da igualdade, ambos
previstos na Constituição Federal.
Mesmo assim, o STF também negou seguimento ao recurso
extraordinário. Entendeu-se, na oportunidade, que para atender o pleito do
magistrado, ter-se-ia de reanalisar as provas do processo, o que não seria
possível ser feito no âmbito da competência do Supremo Tribunal Federal.
E assim virou jurisprudência e ponto final.
E assim virou jurisprudência e ponto final.
Aos leitores do jornal A VOZ, relembro que no século XVII,
Gregório de Matos, famoso literato, poeta e advogado baiano, ao defender um
alferes acusado de haver tratado de forma desrespeitosa o Juiz de Igarassu, ao
chamá-lo de vós, na então capitania de Pernambuco, o poeta baiano ganhou a causa
ao peticionar à Corte Superior, assinalando na sua petição os seguintes versos:
"A El Rei trata-se por vós,
a Deus trata-se por tu,
como trataremos nós
o Juiz de Igarassu:
Tu ou vós, vós ou tu?
a Deus trata-se por tu,
como trataremos nós
o Juiz de Igarassu:
Tu ou vós, vós ou tu?
Nilson Machado de Azevedo
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